terça-feira, 20 de novembro de 2007

Relflexão sobre "Poema em linha reta"

Tomei a liberdade de cortar umas partes desse poema de Fernando Pessoa para encurtar um pouco e ver se o pessoal se anima a ler todo, porque um poema gigante sempre dá uma preguiiiiça de ler...Acho realmente genial um escritor que viveu em um século diferente conseguir produzir um poema completamente atemporal.

Poema em Linha Reta, de Fernando Pessoa

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
(...)
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
(...)
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,

Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
(...)
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
(...)
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;
(...)
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo

Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal
(...)

Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,

Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores
Sem titubear?
(...)





Reflexão:

Até mesmo o ser mais confiante desse mundo já vivenciou um dia onde sua auto-estima deixa a desejar. Nos achamos então feios, ridículos, incompetentes. Tais dias nos trazem uma certa tendência à comparação: todos nos parecem melhores, mais bonitos, mais inteligentes, mais capazes.
“Nunca conheci quem tivesse levado porrada.Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.” Todos nós já levamos porrada, já perdemos, já fomos ridículos, absurdos.As vezes ganhamos, as vezes perdemos,mas é muito mais conveniente esconder os fracassos e defeitos e nos gabar de nossas qualidades e ganhos. Afinal, por qual motivo contaríamos uma derrota? Para mostrar que somos humanos? É muito melhor ser, como diria Fernando Pessoa, um semideus. A verdade é que ser humilde não está na moda, bom mesmo é omitir as derrotas, as porradas e exaltar como somos campeões, como somos o Ideal. Tudo isso tem um certo tom de decadência, porque sabemos que é impossível sempre ganhar, mas mesmo assim continuamos a nos comparar com quem é, aparentemente, o eterno campeão.
Se houvesse um pouco mais de humildade entre as pessoas, nós sairíamos de nossos pedestais e compartilharíamos nossas derrotas. Isso ajudaria a diminuir a distancia que existe entre os seres humanos, que cada vez mais ficam menos solidários com a situação alheia. Acreditamos que para mudar o mundo e ajudar os outros é preciso grandes ações ou mobilizações, o que é um grande equivoco. Conte um mico, uma situação constrangedora, uma derrota para aquele amigo que está num dia difícil, certamente quando você estiver assim, não verá tantos semideuses e campeões, mas sim, humanos.







Luciana Webster Negretto (:

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